Projeto Social na Restinga Muda Vidas com o Basquete

Marco Leal
4 min readApr 10, 2020

O esporte é, muitas vezes, um caminho sem volta.

Para muitos um sonho, quando não atingido pode ser visto como um sinal de que está na hora de parar e se dedicar a outros objetivos, mas para Carlos William, esse sonho não parou em si próprio.

Em 2017, Carlinhos, como é conhecido em toda a comunidade do basquete Porto Alegrense, chegava para mais um dia de treinos, em uma quadra pública no bairro da Restinga. Sozinho, como ele diz preferir.

No entanto, naquele dia outra bola era arremessada na cesta, do outro lado da quadra. As vezes acertava o aro, outras a tabela e, de vez em quando, entrava.

O que era acaso, virou rotina.

“Ele sempre me perguntava ‘o que posso fazer?’, mas eu nunca gostei de explicar as coisas, porque achava que não tinha o potencial de ensinar alguém.” Comentou Carlinhos. “Um dia eu vi que ele estava errando muito e lancei um desafio. Ele pegou, e eu comecei a treinar ele.”

Fernando foi o primeiro aluno de um projeto que nasceria batizado com o nome do bairro de onde ele e seu novo professor vieram, o RTG.

Atualmente cursando educação física, Carlinhos sempre se dedicou ao jogo e à cultura a sua volta, mas, ali, começava sua maior contribuição para a bola laranja.

Logo vieram mais alunos, que Carlinhos começou a atender nas quadras do CECORES e, aos poucos, um time foi formado. Desde então o projeto cresceu exponencialmente e hoje conta com mais de 30 jovens, que vem de várias partes da capital gaúcha para participar dos treinos.

“O mais legal do RTG é mudar vidas com o basquete.” Disse Carlinhos. “Com o projeto já consegui tirar alguns garotos que usavam drogas, que não estudavam, que não tinham perspectiva de vida. Agora eles têm perspectiva, eles sonham, e isso é maravilhoso.”

Tocando o projeto sozinho desde o inicio, Carlinhos hoje tem ajuda de alguns de seus alunos, lideres dentro e fora da quadra. Luiz Alexandre Bueno, estudante de 18 anos, fala como um irmão mais velho de seus colegas de equipe.

“O que eu mais aprendi foi, além de me inspirar nos outros, é fazer os outros se inspirarem em mim.” Disse Luiz. “Ter cabeça, responsabilidade, tanto no basquete como na vida, a gente sempre tem que querer aprender mais, nunca se limitar a achar que sabe tudo.”

Comentando sobre o maior objetivo do RTG, Luiz ecoa o que seu técnico sempre ensinou.

“A gente quer mostrar o basquete pra gurizada, que ali tem um futuro. E, claro, na comunidade onde a gente mora tem muito trafico, e então tentamos fazer com que a gurizada não vá por esse lado. A gente tem exemplos no nosso time de guris que são mais precários, que a vida é mais dura, e o nosso time tenta ajudar eles.”

“Nosso time tenta ser, pra quem se empenha, pra quem merece, pra quem precisa, uma família.”

Filosofia essa que Carlinhos trabalha com palestras recorrentes e também com o auxílio do time que atualmente joga e ajudou a formar, o Panteras Negras.

“A gente tem um valor humano gigante no time.” Ele complementa. “A galera aprende a compartilhar tudo, desde a bolacha, não aceito nenhum atleta meu levar uma bolacha e não dividir com o time todo.”

Essa união reflete na relação dos alunos com o time. Gabriel de Quadros, estudante de 16 anos, passou por um dos momentos mais difíceis da vida no final de 2019, quando perdeu a avó, e foi amparado pelos companheiros de quadra.

“Eu vi que tinha alguém do meu lado pra me apoiar e foi nisso que eu me levantei.” Disse Gabriel. “Desde que eu entrei lá, aprendi realmente o que quer dizer família. Independente se a gente perdesse ou ganhasse algum jogo, a gente sempre estava lá pra ajudar um ao outro.”

Mas se fora da quadra o RTG tem objetivos que vão além do basquete, dentro dela eles são movidos pelo que move todos os atletas.

“A gente quer mostrar pra times grandes de Porto Alegre que estamos vindo bem, que temos atletas em condições de jogar em um patamar mais alto, que eles podem sair até pra fora, pra outros lugares do país.” Disse Luiz.

Atualmente esperando para estrear na segunda edição da Liga de Basquete Amador de Porto Alegre, que deve acontecer apenas na segunda metade por conta da pandemia do Covid-19, a equipe do RTG já participou de diversos torneios sub-18 e teve algumas experiências no cenário adulto da capital.

“Quatro atletas foram jogar no União, tenho atletas em Santa Catarina, as coisas estão expandindo”. Comentou Carlinhos. “Esse ano era o ano que entramos pras competições de verdade, como equipe mesmo.”

Apaixonado pelo basquete desde criança, Carlinhos não se tornou profissional, o que era seu sonho, mas ajudou a construir muitos outros que, talvez sem ele — e sem o basquete –, teriam se perdido.

A equipe do RTG é mais um exemplo de como o esporte muda vidas, e de como os erros dentro de quadra podem levar ao sucesso fora dela.

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